Revolucionaram a forma de fazer compras, juntando lojas, restaurantes e cafés sob o mesmo tecto. Convidavam ao consumo e faziam parte do passeio domingueiro. Hoje, sem escadas rolantes nem insígnias multinacionais, apesar da forte concorrência de shoppings mais modernos e do sufoco financeiro que vivem muitas famílias, alguns destes antigos centros comerciais continuam a fazer parte da comunidade, habituada à simpatia de quem os serve há várias gerações.
Quando foi inaugurado, há mais de quatro décadas, o Centro Comercial Gafa gerou a loucura entre clientes e lojistas. Tal era o mar de pessoas que se juntava para passear e fazer compras naquele novo espaço de Alcobaça, que os comerciantes não tinham mãos nem horas suficientes para atender tanta gente.
Tão antigo é o centro comercial, que Lurdes Fernandes, filha de um dos três construtores, demora-se nas contas. “Abriu há 41 ou 42 anos. Estava grávida do meu filho.” O Gafa foi construído por etapas e [LER_MAIS]é composto por três lotes com cerca de 40 lojas, contabiliza Lurdes, que foi uma das estreantes do centro comercial. “Tinha muito movimento. As pessoas iam passear ali ao fim-de-semana. Visitavam-no até com as lojas fechadas”, lembra a filha do construtor, que só deixou o Gafa há dois anos, para se instalar nas imediações, num estabelecimento de rua mais pequeno. “Dava muito trabalho”, justifica a septuagenária.
“Há 40 anos não se cabia cá dentro com tanta gente”, corrobora Ema Barros, outra lojista que estreou o Gafa e que nele se mantém de pedra e cal. O seu negócio começou com um mini-mercado, que tinha padaria de fabrico próprio. “Ao sábado vendia 800 pães de leite”, recorda Ema, que abria o estabelecimento às 9 horas e só arredava pé à meia-noite, para conseguir deixar tudo arrumado.
Os estudantes, e os pais dos miúdos, eram presença assídua. E agora, que chegaram os netos, Ema vai conhecendo uma terceira geração de clientes.
“As pessoas têm hoje mais fartura de oferta e estão mais exigentes”, observa a lojista. Também foram fechando fábricas de perto, mais recentemente surgiu a pandemia e o movimento do Gafa e de Alcobaça ressentiu-se, aponta Ema, que não cruzou os braços. Há meia dúzia de anos decidiu fazer obras e transformou o negócio numa cafetaria.
O Centro Comercial Liz, em Leiria, é outro resistente. Foi inaugurado há 39 anos, explica Maria da Conceição Sousa, que mantém a sua retrosaria desde que este espaço abriu. “Tinha loja na Rua Direita, mas vi que o comércio se estava a expandir para esta zona e vim também”, recorda. “Era tanto o movimento, que ao final do dia já nem tinha força para arrumar a loja”, conta a comerciante.
O negócio sempre correu bem. Só nos últimos 15 anos começou a arrefecer. E a falta de estacionamento gratuito nas imediações é um dos constrangimentos para quem só quer fazer uma rápida visita ao estabelecimento, aponta. Felizmente, a retrosaria continua a contar com muitos clientes fieis, que chegam para comprar e para pedir opiniões.
Gostar do que se faz, modernizar, diversificar oferta e dar atenção ao público têm sido as chaves da longevidade, acredita Maria da Conceição. Ser resiliente é outra das suas recomendações. “Alguns julgam que uma loja se faz num ano. E não faz”, salienta a comerciante, em jeito de justificação para a rotatividade de negócios que tem verificado ao seu redor.
Praticar rendas mais baixas também poderia ser um estímulo dos proprietários que ajudaria a ocupar as lojas vagas, propõe Maria da Conceição.
Tão antiga como a retrosaria é a Libarina, a loja de artigos utilitários e de decoração de Olívia Ribeiro. A proprietária ainda recorda o dia da inauguração, vivida em êxtase pela população, atraída pelas novidades do centro e pelo cantor que animava o recinto. Em épocas altas, como o Natal, Olívia chegava a ter duas ou três funcionárias para atender numa casa que estava sempre cheia. Hoje está sozinha ao balcão e basta-lhe a filha a dar apoio uma vez ou outra.
Apesar da chegada de outros shoppings, o negócio foi resultando para todos durante bastante tempo. Mas, depois da pandemia e da crise, que se tem agravado, o movimento já se ressente, constata a proprietária. Felizmente, há público fiel. “Tenho uma cliente que mora para lá do Porto, que comprou o enxoval aqui, há 36 anos, e que veio de novo, porque o material é bom e dura.”
Custódio Marques, sapateiro, é um dos resistentes do Centro Comercial Lumar, que foi inaugurado, na Marinha Grande, dia 11 de Outubro de 1986. Quando abriu a loja há 37 anos, os tempos eram mais favoráveis, com muito movimento e negócio. “Hoje preferem comprar do que arranjar e usam muitas sapatilhas”, conta Custódio.
“Mas há clientes habituais. E como a loja é nossa, vai dando”, acrescenta Isabel, a esposa, enquanto procura solução para uma capa usada de um instrumento musical. De qualquer modo, as rendas não são tão altas como nos shoppings modernos, compara a comerciante. “As modernices também se pagam.”
Isso explica que a maioria das lojas do Lumar estejam ocupadas e que, apesar da rotatividade, haja sempre alguém novo a instalar-se. “No início do mês abriu uma loja de brindes e publicidade”, exemplifica Custódio.
Maria Marrazes, florista da Pétala, tem a mesma opinião. “O centro comercial é cuidado, está limpo e arranjado, quase não há valores em atraso entre os condóminos e as rendas são mais acessíveis do que nos shoppigns mais recentes”, valoriza a florista, que destaca a centralidade e a proximidade deste espaço a serviços públicos.
Carlos Alexandre tem cabeleireiro aberto no Lumar desde o início do centro comercial. Nos anos mais dourados, chegou a ter uma equipa de seis funcionários, que mal conseguiam encontrar vagas entre tantas marcações. Mas a cidade cresceu, ganhou outros cabeleireiros, e a pandemia também esfriou o negócio.
“Mas continuamos a ter muitos clientes fixos, alguns desde início. E há um bom ambiente entre lojistas, que são como família”, realça o cabeleireiro.
A Pizzaria 100 Nome é outro clássico do Lumar. Maria Rosa inaugurou o estabelecimento em 1986 e tem vindo a crescer, à medida que o hábito de comer fora de casa se tornou mais comum. Além das obras de modernização do espaço actual, adquiriu recentemente uma loja no mesmo andar, na expectativa de poder ampliar o negócio.
Foram Vítor e Olga Silva que deixaram vaga a loja que passará a ser explorada pela Pizzaria 100 Nome. Em 1986, o arranque do clube de vídeo O Vitinho foi um sucesso tal, assim como nos 20 anos que se seguiram, que o casal mal tinha tempo para tirar umas horas de folga ao domingo.
Mas a chegada da internet acabou com o aluguer de vídeos, levando Vítor e Olga a introduzir no negócio as encadernações, as fotocópias e a venda de electrodomésticos. Todavia, as grandes superfícies comerciais levaram vantagem sobre a loja familiar e o casal decidiu este ano terminar com a actividade.
Deixaram o centro comercial como lojistas, mas não como clientes. É na Pastelaria Lumar, outra resistente deste espaço – actualmente gerida por Dulce Lourenço- que Vítor e Olga continuam a encontrar os amigos de sempre e os bolos que “são uma maravilha”.
Já a Neomáquina é a grande resistente do Parque Comercial Europa, complexo de lojas situado junto ao IC2, na localidade de Travasso, em Pombal. A loja fundada por Luís Fialho e Lídia Eugénio foi inaugurada em 1989, mas, alguns anos antes, já o comendador Manuel da Mota, então proprietário do parque, tinha convidado o casal a instalar-se naquele complexo, onde inicialmente abriu um espaço dedicado à comercialização de brinquedos, recorda David Fialho, filho dos fundadores.
“Durante meses, a Neomáquina foi a maior superfície comercial do distrito, até à abertura do Continente de Leiria”, salienta David. E as lojas do Parque Comercial Europa eram muito movimentadas, havendo também o cuidado da parte do proprietário do complexo de garantir animação, com a actuação de diferentes ranchos folclóricos a cada domingo, prossegue David Fialho.
As auto-estradas retiram parte do movimento do IC2 e o parque também sofreu com a concorrência de outros shoppings mais modernos que se foram instalando na região. Apesar disso, as lojas deste complexo continuam ocupadas, com negócios de restauração, decoração, danceteria, escritórios de transportadoras, entre muitas outras actividades. E a Neomáquina continua a ter muitos clientes fiéis.
A loja tem oferta diversificada, desde electrodomésticos, vestuário, supermercado/bazar, artigos desportivos, entre outros, e no total emprega 35 funcionários, refere David.