O Ministério do Ambiente confirma o encaminhamento de lixo proveniente de Itália para o aterro da Resilei, em Leiria, mas assegura que estão em causa resíduos não perigosos, “semelhantes aos que produzimos nas nossas casas”, uma informação que a associação ambientalista Zero corrobora. Por que motivo é rentável o negócio, que envolve transporte marítimo entre países distantes? Rui Berkemeier, da Zero, explica: “Como a Taxa de Gestão de Resíduos que o Estado cobra é muito baixa, compensa pôr resíduos em Portugal”.
São 11 euros por tonelada, muito abaixo da média europeia, que ronda os 80 euros por tonelada (sobe para 22 euros em Setembro por proposta do PAN que o Governo vai levar à prática).
A importação de resíduos destinados a eliminação em aterro está suspensa desde 16 de Maio e até 31 de Dezembro de 2020.
“A questão que se coloca no caso da Resilei é saber se esses resíduos já estavam em Portugal ou não em 16 de Maio”, afirma Rui Berkemeier. “Nós questionámos o Ministério do Ambiente [sobre a aplicação do decreto-lei 22/2020] mas ainda não obtivemos resposta”.
Ao JORNAL DE LEIRIA, o Ministério do Ambiente adianta que “aquando da suspensão das autorizações para a entrada de resíduos em território nacional existiam dois processos de notificação, aprovados por um ano, relativos a resíduos não perigosos classificados com o código LER 191212, provenientes de Itália e com destino à unidade Centro Integrado de Tratamento de Resíduos Industriais de Leiria”.
Em conjunto, previam o movimento de até cerca de 40.000 toneladas de resíduos.
“De acordo com o n.º 2 do artigo 35º-J do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de Março, na redacção atual, os resíduos que já se encontravam em território nacional, a 16 de Maio, podem prosseguir o seu movimento até às instalações de destino”, explica a mesma fonte oficial.
Diz ainda que “a Agência Portuguesa do Ambiente e a Inspecção-Geral da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território estão a diligenciar no sentido de assegurar o cumprimento do previsto naquela disposição legal, estando o Ministério do Ambiente e da Acção Climática a acompanhar de perto a situação”.
O lixo de Itália transportado para o aterro da Resilei na freguesia de Maceira, segundo o Ministério do Ambiente, é um conjunto de “resíduos não perigosos classificados com o código LER 191212, resultantes do tratamento mecânico de resíduos urbanos em tudo semelhantes aos resíduos produzidos nas nossas casas”.
“Não há resíduos industriais provenientes de Itália a serem encaminhados para o aterro da Resilei”, enfatiza o Ministério do Ambiente.
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Rui Berkemeier também desdramatiza e garante que o processo “é normalmente bastante controlado”, com dois momentos de análise em laboratório, um na exportação, outro na chegada a território nacional.
“Está tratado, não tem cheiro, é resíduo urbano, não é resíduo perigoso”, afirma. “É um resíduo com muitos anos, que está estabilizado”.
De acordo com o especialista da associação Zero, a importação – a Resilei cobra um preço aos italianos para receber o lixo no aterro da Maceira e paga a Taxa de Gestão de Resíduos ao Estado português – resulta de um passivo ambiental acumulado em Itália, país que chegou a ter 6 milhões de toneladas por tratar, mais do que Portugal produz num ano.
“Vieram para Portugal porque Itália não tinha condições para os tratar momentaneamente. Mas o que se pretende é que Itália tenha condições. A própria União Europeia o que pretende é que os resíduos sejam tratados o mais perto possível do local de produção”, diz.
Conforme o JORNAL DE LEIRIA noticiou online na quinta-feira, 18 de Junho, moradores do Picheleiro expuseram o caso através de uma queixa enviada à vereadora do Ambiente na Câmara Municipal de Leiria.
Dizem-se preocupados porque “já existe uma pressão enorme na bacia hidrográfica do ribeiro do Picheleiro causada pelo somatório dos impactos da Resilei, Valorlis e aviários da Lusiaves” e denunciam “derrames de lixiviados no emissário que passa paralelo ao ribeiro do Picheleiro que são tão concentrados que matam toda a vegetação onde passam e se infiltram quer no solo quer na linha de água”.
Na sexta-feira, o Município de Leiria, “enquanto parte interessada na preservação do ambiente e na salvaguarda da saúde pública”, anunciou ter iniciado diligências “no sentido de obter informações adicionais junto das entidades competentes”.
Já a Resilei garante ao JORNAL DE LEIRIA que cumpre “todos os requisitos legais inerentes ao desenvolvimento da sua actividade, não tendo, em nenhum momento, incumprido com os devidos licenciamentos ambientais”. E assegura que “nunca colocará em risco os seus colaboradores ou populações próximas”.