Se fosse descrito pelo poeta Alexandre O’Neil, o Teatro da Rainha, de Caldas da Rainha, seria “uma coisa em forma de assim”, tal é a sua capacidade de fugir à convencionalidade.
Com quase quatro décadas de existência e trabalho de palco, esta companhia é, acima de tudo, num País onde a cultura é o parente pobre, um exemplo da palavra da moda: “resiliência”.
“O teatro é um universo que cria mais espectadores do que qualquer outra arte”, diz Fernando Mora Ramos, o director artístico desta estrutura artística.
A vontade de construir e desconstruir, desafiando constantemente a mente do público, leva a que o Teatro da Rainha esteja sempre em estado de prontidão. Neste momento, conta com quatro espectáculos preparados para sair em digressão, são eles, “Pertinho da Torre Eifel”, “Planeta Vinil”, “Discurso sobre o Filho-da-Puta”, com o famoso texto de Alberto Pimenta, e “Na cama com Ofélia”.
“E vamos partir para o quinto, que é ‘Mandrágora’, de Maquiavel. Em Portugal, há uma política de criar espectáculos que, daí a três ou quatro dias, morrem. Não é uma política de criar espectadores. É uma política luxuosa, que não rentabiliza o investimento. Por vezes, parece que só se vive para aquela pirotecnia da estreia. É muito fogo de artifício. Portugal precisa de reinventar o seu teatro e cumprir tradi- ções que outros, há muito praticam”, diz Mora Ramos.
A sala estúdio do Teatro da Rainha, com 50 lugares, acolhe 25 ou 30 representações, durante cerca de um mês, quase sempre com casas cheias, com público fiel e com alunos de Teatro da ESAD.CR.
Alguns dos espectáculos são também apresentados nas freguesias do concelho. “Médico à Força, uma peça mais leve, foi muito apreciada, porque a cidade tem uma tradição ligada à saúde e teve o primeiro hospital termal público da Europa.
Fez mais de 50 apresentações para cerca de cinco mil pessoas. Ou seja, neste concelho com 50 mil pessoas, cerca de 10% viu a peça”, calcula o director artístico.
O contributo do Teatro da Rainha tem sido reconhecido pela DGArtes, que tem apoiado regularmente a estrutura teatral. Mas, um dos desafios para o futuro próximo, é a nova casa da companhia, que resulta de 37 anos de actividade e de experiência profissional.
“O nosso núcleo duro já passou por muitas salas e cidades”, recorda o director, que revela que a futura sala da companhia teatral de Caldas da Rainha será uma síntese das experiências dos seus elementos com as arquitecturas teatrais, do teatro grego, aos teatros em ferradura ou em arena.
“Chegámos ao desenho deste edifício que é…. um espaço vazio. A busca pela contemporaneidade, levou-nos a este conceito. Neste momento, não há uma relação dominante cena-sala e esta forma vazia permite, de acordo com cada espectáculo, a configuração que entendermos.”
“Conhecer poesia é como estar vivo”
“Porque somos todos bípedes e falantes” o Diga 33, criado pelo colectivo, é um programa de poesia contemporânea “olhada de todos os ângulos”, da edição à leitura em cena, passando pelo trabalho autoral.
É uma das mais conhecidas rubricas do Teatro da Rainha. “Há poesia para apenas ser lida e há poesia para ser lida em cena, para ser berrada, para ser dita guturalmente”, afirma Fernando Mora Ramos.
O Diga 33 convida autores, coloca-os em diálogo, a ler partes dos seus poemas e a dizer o que pensam da poesia, porque escrevem e para quem escrevem. O público é gente que se habituou a participar.
“Descobrem dentro de si a capacidade de ler poesia e dela tirar prazer. Conhecer poesia é como respirar. É como estar vivo. É potenciar o que andamos por cá a fazer. A poesia tem dimensão cognitiva, de dimensão do real, de experimentação, da sensibilidade. O Diga 33 é ver a poesia de todos os seus ângulos e meter-lhe as pessoas dentro.”
O Teatro da Rainha – Associação Republicana da Rainha e Etc. foi fundado em 1985, e após alguns anos de trabalho um pouco por todo o País, fixou- -se nas Caldas da Rainha.
Primeiro na Casa da Cultura, passando por palcos inusitados como o sótão da antiga lavandaria do Hospital Termal. Hoje, está instalado num espaço junto à Escola de Hotelaria e Turismo do Oeste.