Tinha apenas 14 anos quando começou a trabalhar na tasca que mais tarde passou para as suas mãos. Meio século depois, Gracinda Santos, que todos conhecem por ‘Ti Gracinda’, continua ao leme da tasca que herdou o nome pelo qual é tratada e onde reinam os petiscos tradicionais.
Localizada na Rua de Nossa Senhora da Encarnação, a Ti Gracinda será a mais emblemática casa de petiscos de Leiria. “As pessoas dizem que é a melhor. Trabalhamos para isso”, afiança Gracinda Santos, numa pausa entre os afazeres da cozinha, depois de mais um almoço com casa cheia e ainda com clientes a terminar a refeição na sala para grupos.
Antes de iniciar a conversa para recordar o meio século passado entre a cozinha e o balcão da tasca, pede mais uns minutos, para fazer um telefonema e tentar resolver um imprevisto. Tinha programado servir favas no dia seguinte, mas a sua fornecedora habitual, uma pequena produtora de uma aldeia de Leiria, já não tem mais. “Paciência. Outra coisa se arranjará”.
E opções não faltarão para degustar num ambiente familiar. Carapaus, petinga, raia e bacalhau frito, pataniscas e pastéis de bacalhau, salada de polvo e iscas são algumas das iguarias servidas na Ti Gracinda, onde, à quinta-feira, é dia de cozido à portuguesa. Aos pratos habituais, juntam-se outros, como galo de cabidela, feijoada, favas ou bacalhau com batatas a murro, que vão diversificando a ementa, centrada na gastronomia tradicional. “É o que sei fazer. Tirei o ‘curso’ com a vida. Aprendi a cozinhar comigo mesma, experimentando e aperfeiçoando.”
No desfiar de memórias, Gracinda Santos recua até à sua adolescência. Natural de Valongo, aldeia da freguesia de Colmeias, Leiria, conta que começou a trabalhar aos 14 anos. A tasca era, então, explorada por uma irmã sua, que mais tarde arranjou outro negócio e tentou o trespasse do estabelecimento. “Decidi ficar com o espaço. No início, pagava renda. Depois, vi que era capaz e comprei o trespasse”, recorda.
Começou sozinha. Depois contratou uma funcionária e, dez anos depois, o marido, que conheceu como cliente da tasca, juntou-se à equipa, da qual também faz parte a filha mais velha do casal, formada em Educação de Infância. “É uma grande mais-valia. Gosta muito de interagir com as pessoas e isso é meio caminho andado”, elogia Gracinda Santos, que aponta o trabalho como o segredo do negócio.
“Agarrei a vida com as duas mãos. Esfarrapei-me toda a trabalhar. Durante dez anos, não fechei a porta um dia. Depois, encerrava parte da tarde de domingo. Deixava os lanches preparados, ia passear com os meus filhos e depois voltava para completar o resto do dia. Agora, folgamos ao domingo”, conta Gracinda Santos, que se considera uma “privilegiada” por fazer o que gosta.
“Tenho a percepção de que só somos capazes de vencer se fizermos o que gostamos”, acrescenta, sem esconder o orgulho por ter conseguido “criar a melhor casa de petiscos” de Leiria. “É o que as pessoas dizem”, alega, salientando ainda a diversidade da clientela: “vem toda a categoria de gente, do pedreiro, ao advogado ou ao juiz e bancário, por exemplo”.