E se, durante as grandes competições mundiais de surf, fosse possível apurar, ao centímetro, o tamanho de cada onda, minutos depois dela ser surfada? Esta é uma realidade muito ambicionada pelos atletas, que querem bater recordes, vencer prémios e conquistar patrocínios.
Actualmente, a altura de cada onda gigante é calculada através de registos fotográficos, tendo em conta a altura do surfista e a sua posição na onda, um método que dá espaço a polémicas.
O actual detentor da maior onda do mundo surfada é o alemão Sebastian Steudtner, que ‘navegou’ por uma onda de 26,21 metros em 2020, na Praia do Norte. No entanto, em Janeiro deste ano, o brasileiro Lucas ‘Chumbo’ defendeu que surfou uma onda entre os 27 e os 30 metros, que ainda não foi homologada pelo Guinness World Records.
O projecto Big Wave Tracker, aplicado na Nazaré, vai ajudar a dissipar estas dúvidas e, ao mesmo tempo, permitir adquirir mais conhecimento científico sobre cada onda. Pedro Almeida, cientista sénior da CoLAB +Atlantic e coordenador de uma equipa da instituição que trabalha com o desenvolvimento de aplicações marinhas e costeiras, explica o âmbito desta tecnologia. “Começámos exactamente e por causa da questão desportiva. Havia muito pouco consenso na maneira como são definidas as alturas das ondas e os próprios recordes são baseados nessas medições que não são, de todo, científicas.”
O especialista adianta que o protótipo já desenvolvido, através de um algoritmo, consegue “acompanhar a onda” no momento em que ela é surfada, desde a sua formação à rebentação na praia.
O Big Wave Tracker tem o potencial de alterar a forma como o surf é visto em todo o mundo. Por um lado, os surfistas podem analisar, com mais precisão, o seu desempenho e a forma como a onda se desenvolveu. Por outro, o público pode também conhecer os detalhes de cada onda e ter a certeza de que estão perante um recorde do mundo.
“Queremos demonstrar que isto é útil. Tem interesse para os campeonatos, mas também para o público em geral e para quem quer compreender melhor este fenómeno”, afirma Pedro Almeida.
Os testes já decorrem há vários meses e o responsável do projecto adianta que os surfistas têm mostrado curiosidade em experimentar esta nova forma de medição. A World Surf League também está a acompanhar o projecto que, neste momento, precisa de financiamento para ser aplicado.
Para já, o protótipo ainda não permite apurar a informação de cada onda a tempo real. Mas esta realidade “é claramente possível”. Só falta “infra-estrutura”, garante Pedro Almeida. “Temos em cima da mesa essa questão, que tem vindo a surgir, e a World Surf League interessa-se por esse formato.”
Neste projecto, o Município da Nazaré apoia o CoLAB +Atlantic com a abertura do Forte de São Miguel e oferta de acomodação aos cientistas envolvidos nos estudos e Salvador Formiga, vereador da autarquia com o pelouro da Economia e do Mar, defende que o Big Wave Tracker tem a capacidade de “transportar o desporto das ondas gigantes para um patamar impensável há uns anos”.
Os estudos têm atraído diversas comitivas de cientistas de vários pontos do Mundo e, além da componente desportiva, o lado da ciência associada ao Canhão da Nazaré também está a captar atenções para este concelho. “Queremos que a Nazaré seja procurada não apenas pelo surf, mas também pelos cientistas”, vincou o vereador, ao classificar esta tecnologia como “o VAR das ondas gigantes”.
O cientista Pedro Almeida explica que o Big Wave Tracker vai acompanhar todo o desenvolvimento das ondas
Benefícios são “enormes”
Um dos surfistas que mais tem estado em contacto com o Big Wave Tracker é João Macedo, o primeiro surfista profissional português e europeu a qualificar-se para o Mundial de Ondas Gigantes.
O atleta garante que os benefícios deste projecto “são enormes” e que a união entre a ciência e a “arte do surf” pode trazer mais adeptos para o desporto. “Aquilo que a comunidade quer é que a ciência sirva a parte técnica do surf, mas que esta tenha a última palavra”, já que os prémios não dependem só da altura da onda, mas principalmente da técnica aplicada e do risco associado a cada onda, aspectos só calculados a olho nu.
O surfista acredita que, da Nazaré, o Big Wave Tracker pode, e deve, ser catapultado para outros dos maiores palcos das ondas gigantes, como o Havai ou Califórnia.
O projecto Big Wave Tracker pode ser acompanhado através do instagram (@bigwavetracker) ou pelo site https://www.bigwavetracker.com.