A equipa do Festival A Porta pergunta, Leiria responde. O que pode ser a Villa Portela? Uma casa de fadas ou unicórnios, uma casa de doces com sofá de marhsmallows, uma biblioteca, um jardim botânico, uma casa assombrada com vampiros congelados, um espaço para residências artísticas e exposições gratuitas, um café com esplanada, uma galeria, o lugar onde Travis Scott e Drake se encontram em palco, um território para as crianças fazerem arte, um centro de abrigo para animais, um aeroporto no telhado e uma festa gigante na varanda, uma discoteca popular, colchões para pessoas se deitarem a ver o céu, um centro de artes performativas, uma espécie de Serralves misturada com o Maus Hábitos, um Pinhal das Artes em simbiose com Serralves e o EDP Cool Jazz, uma Gulbenkian, um bar, um museu agrícola, um orfanato, uma praia fluvial, um terreno para toda a gente com legumes para matar a fome, um salão de chá e restaurante, um fundação para a investigação científica, a Feira de Leiria há 100 anos, uma grande oficina de artistas e artesãos, uma pista de neve artificial, jogos tradicionais, um destino de piqueniques com rios e lagos, um parque aquático com escorregas, a casa do Capitão Cocas, um centro cívico, uma linha de comboio, a base secreta do FBI, uma casa slime, um hotel de paraíso grátis e comunitário para todos os pobres do país, um centro ocupacional e casa de residência para pessoas com doença mental crónica, um lugar de encontros entre gerações. E mais, muito mais, se imagina que a Villa Portela pode ser.
O desafio lançado pela organização do Festival A Porta – que este ano se realiza em nove dias e três fins-de-semana de Julho e tem a Villa Portela, precisamente, como ponto central – está a reunir sonhos, ideias e contributos de todo o tipo, desejos formulados por crianças, jovens e adultos para o chalet do século XIX, a partir de duas perguntas: O que imaginas que já aconteceu nesta casa e neste jardim? O que achas que este espaço poderá ser no futuro?
Há quem diga que “com a integração da Villa Portela na rede intergaláctica de portais interdimensionais apenas se pode esperar o melhor para o futuro”, embora, “como em qualquer salto interdimensional”, seja “difícil prever as consequências exactas do evento, a não ser a ocorrência de inúmeros eventos”. Há quem projecte um corrimão para escorregar, em grandes dimensões, inspirado no corrimão que existe no interior da casa. Há quem veja ali “o espaço de todos, finalmente habitantes”. E há quem afirme que “está na hora de deitar abaixo o muro da Portela à moda do muro de Berlim”, com o propósito de estabelecer “um parque aberto”.
As sugestões têm chegado directamente ao site oficial festivalaporta.pt e também através da réplica em miniatura da Villa Portela, a três dimensões, que circulou por cafés, restaurantes, escolas, livrarias, associações, lares e grupos informais. A organização do Festival A Porta pretende que este seja o mote para o despertar de um novo pensamento urbano e imaginário colectivo, assente num programa construído em diálogo aberto. As respostas da população são a base de trabalho para o ciclo de residências artísticas que vai culminar em intervenções de diferentes formatos a serem instaladas e exibidas na Villa Portela, durante o Festival, que acontece nos dias 2, 3, 4, 9, 10, 11, 16, 17 e 18 de Julho.
Se sobre o futuro não faltam palavras nem imaginação, o mesmo se pode dizer dos contributos acerca do passado, do que já aconteceu naquela casa e naquele jardim. Tempos à Great Gatsby, crianças a brincar como reis, as férias de um príncipe, o próprio D. Dinis a viver no palacete, mulheres a beber whisky e a fumar charutos depois do jantar, amores proibidos, um mundo de chocolate infinito, planos para a implantação da República, um cometa a provocar a extinção dos dinossauros, um cão de guarda e a relva sempre bem cuidada, um homem a esconder 10 mil euros de geração em geração.
Uma vizinha escreve: “Meu filho e eu já inventámos imensas histórias sentados na varanda a olhar para o imenso terreno e os contornos do chalet. Geralmente tem a ver com uma maldição que encolheu os moradores que tiveram que ir viver no jardim por não conseguirem mais abrir a porta da casa”.
Para uns, “era na Villa Portela que as personagens dos filmes de desenhos animados nasciam, de uma sementinha plantada no jardim”. Para outros, a arquitectura do edifício como agregador de raios delta é comprovada pelo surgimento esporádico e aleatório, ali mesmo, de estruturas semelhantes a cães de loiça gigantes. Uma criança ensaia um conto: há milhões de anos, o casal mais rico de Leiria vivia na maior mansão da cidade, que tinha sido construída por um lenhador, mais pobre. Pelo sacrifício dele, os proprietários deram uma festa. Nessa noite, morreram discretamente, enquanto o lenhador foi levado por um lobo.
Imóvel com classificação de interesse municipal, a Villa Portela foi construída no século XIX, possivelmente entre 1894 e 1896. Em Março de 2017, o Município de Leiria adquiriu a Villa Portela aos proprietários, Ricardo Charters de Azevedo e Helena Charters de Azevedo, mediante contrato de renda vitalícia, com o objectivo de ali criar um centro de artes, que continua por executar.