Desengane-se quem pensa que os bombeiros voluntários em Portugal trabalham com amadorismo. A garantia é deixada por Jaime Marta Soares, que afirma que estes homens e mulheres são sinónimo de “conhecimento, competência e profissionalismo”.
Também Guilherme Isidro, comandante dos bombeiros de Ourém, considera que “os voluntários estão tão preparados como os profissionais no que à formação diz respeito”, embora admita que “os profissionais podem e devem estar melhor na questão do treino permanente e preparação técnica”.
O presidente da Escola Nacional de Bombeiros, José Ferreira, afirma que a formação que é dada não distingue profissionais de voluntários, pelo que reforça que os “bombeiros portugueses estão devidamente preparados e os profissionais não sabem mais do que os voluntários”.
A diferença, concorda, poderá estar na condição física. No entanto, José Ferreira informa que além da formação existe a instrução, que são os exercícios de simulação de situações reais. “Também é obrigatória e o responsável é o comandante de cada corpo de bombeiro.”
Aliás, o plano anual de instrução tem de ser entregue na Autoridade Nacional de Protecção Civil para garantir a operacionalidade e eficácia dos elementos. No mínimo, segundo José Ferreira, são obrigatórias 50 horas de instrução por ano.
“No nosso distrito sei que são realizados treinos operacionais, por vezes, envolvendo vários corpos de bombeiros.”
[LER_MAIS] Luís Lopes revela que nos Voluntários de Leiria existe um plano com circuitos temáticos e os elementos são sujeitos a testes físicos anuais, que incluem testes de recuperação em esforço e flexões e abdominais. Há pessoas com excesso de peso ou com diabetes e há que ter a preocupação de os acompanhar.”
Aqui, o voluntariado vai mais além. Homens e mulheres que são na sua vida profissional licenciados em desporto, médicos ou enfermeiros colaboraram em planos específicos para os colegas. Guilherme Isidro realça que “em todas as estruturas existem elementos muito bem preparados fisicamente e outros com deficiente preparação”.
Nos voluntários “a sua preparação é feita muito pelo seu hábito e disponibilidade de vida”, enquanto nos profissionais “deve ser uma obrigação dentro do horário de trabalho, com avaliação anual”.
A formação divide-se em inicial e de progressão na carreira. No processo de recrutamento, a formação ministrada no quartel de bombeiros, pela estrutura de comando. Das 250 horas de todo o percurso, 100 estão destinadas às áreas da saúde, salvamento e desencarceramento, da responsabilidade da ENB.
“No final, os elementos são obrigados a prestar uma prova de conhecimento perante um júri”, explica José Ferreira. Ultrapassada esta etapa, os recrutas têm um período probatório de três meses, onde cumprem um estágio acompanhados por um tutor, findo o qual adquirem o estatuto de bombeiro de terceira classe.
De três em três anos, os bombeiros podem subir de posto, desde que haja vagas no quadro. Para cada nova etapa terão de fazer novas formações que incluem liderança e motivação.
José Ferreira adianta que ainda existem formações específicas como as dirigidas a matérias perigosas. “O objectivo primordial neste processo de recrutamento é que as pessoas quando chegam ao final se sintam à vontade para serem bombeiros.
Nos Voluntários de Leiria damos importância ao espírito de equipa e entreajuda, pelo que fazem o processo todo em conjunto para prevalecer que nos bombeiros tudo se faz em equipa, estejam ou não no mesmo quartel”, frisa Luís Lopes.
José Ferreira diz que existem equipas de apoio psicossocial em todos os distritos, que intervêm inicialmente. “Se for necessário um acompanhamento prolongado, os elementos são encaminhados para o Serviço Nacional de Saúde.” Nos Voluntários de Leiria, uma bombeira psicóloga é uma mais-valia na corporação, pois acompanha directamente os colegas. “Mesmo no processo de recrutamento pode intervir numa situação externa. Por exemplo, uma pessoa que tenha passado por um acidente de viação marcante, pode ter um acompanhamento para que o bombeiro numa missão real não bloqueie e não vá agravar aquilo que tem como trauma noutras situações”, afirma Luís Lopes.
Voz dos Bombeiros
1- O que o motivou para ser bombeiro voluntário? 2- Sente-se preparado para enfrentar qualquer ocorrência, mesmo as mais complicadas? 3- Qual o reconhecimento que os voluntários deveriam ter?
Sara Pais, 27 anos, B.V. Maceira
1- Entrei para os bombeiros com 14 anos, idade em que ainda não sabemos bem o que queremos. O o meu maior motivo foi a minha mãe, que também é bombeira. 2- Sim sinto…mediante as minhas capacidades, faço sempre o melhor que posso e consigo. 3- Para voluntariado exigem bastante de nós, principalmente em termos de formação para assistir quem mais precisa em todas as áreas (que faz todo o sentido), mas acho que não somos reconhecidos em termos de regalias.
André Granja, 26 anos, B.V. Marinha Grande
1- Entrei para os bombeiros, em 2005, por influência dos meus pais, que já o eram. 'Hoje' sou bombeiro voluntário para ajudar o próximo e orgulho-me por cada missão feita. Para se ser bombeiro é preciso ter gosto e dedicação, porque apesar de sermos voluntários de nome, somos profissionais na acção e no tempo que é preciso dispensar para cumprir com os mínimos. 2- Sim, sinto-me preparado para desempenhar qualquer missão que me é confiada. Mas, os bombeiros não têm que estar só preparados para os incêndios florestais, visto que há outras missões que são tanto ou mais exigentes e ocorrem ao longo de todo o ano. 3- Os bombeiros merecem mais reconhecimento a nível nacional, mas não a nível monetário, porque, assim, não seriam bombeiros voluntários. Há tanto tempo que se ouve falar do Cartão Social do Bombeiro e nunca mais chega. Podíamos ter alguns benefícios em transportes públicos ou no consumo de água, como existe em alguns municípios. É mais fácil criticar a actuação dos bombeiros do que propriamente reconhecer o seu trabalho, e vimos isso agora durante o combate as chamas. Se nós bombeiros aparecemos nos fogos é porque algo antes falhou, nomeadamente a prevenção.
Clímaco Baptista, 38 anos, Caxarias
1- Entrei há 20 anos pelo espírito de entre-ajuda e a vontade de ajudar os outros. 2 – Houve uma grande evolução na formação e preparação dos bombeiros. Hoje, será impensável que alguém entre num carro de bombeiros ou numa ambulância sem estar preparado. Também em termos do equipamento de protecção houve uma evolução enorme. 3 – Ainda não há o reconhecimento devido aos bombeiros voluntários. Somos 'mão-de-obra' barata para o Estado, com poucos ou nenhuns benefícios por isso.
Bruno Catarino, 24 anos, B.V. Batalha
1- Para a população o bombeiro tem uma grande importância: ser capaz de salvar alguém, ajudar o próximo ou enfrentar novos desafios e medos. Foi o que mais me motivou. 2- Nunca estamos preparados, dado que todas as ocorrências têm exigências distintas. Mas, as formações são constantes e as práticas mais próximas do real. 3 – Somos bombeiros 365 dias por ano, dedicando-nos a áreas distintas. Deveríamos ter reconhecimento não só do povo, mas como de quem o representa, traduzindo-se em acções, apoios e materiais.