Depois de 40 anos emigrado em França, Luís Simões preparava- -se agora para regressar a Alvaiázere e avançar com um projecto turístico numa antiga quinta agrícola que adquiriu, há vários anos, com o objectivo de “um dia investir na terra”.
O sonho pode, contudo, estar comprometido com a ampliação da zona industrial de Tróia, um projecto do Município de Alvaiázere que já tem aprovada uma candidatura a fundos comunitários, no valor de um milhão de euros, e que irá implicar o abate de dezenas de carvalhos, sobreiros e azinheiras – estas duas últimas espécies protegidas -, incluindo alguns exemplares centenários.
Só na propriedade de Luís Simões, está previsto o corte de cerca de 40 árvores, o que, a concretizar- se, “inviabilizará" o projecto turístico. “É um crime ambiental”, afirma o emigrante, que não se conforma com a ideia de ver “arrasado” o que demorou “tantos anos e até séculos” a crescer.
O proprietário frisa que a actual zona industrial, onde apenas existe uma empresa a laborar, tem vários pavilhões e lotes devolutos e que a cerca de “três quilómetros” existe uma outra com "espaço disponível”.
“[A expansão da zona industrial de Tróia] É um absurdo em termos de ordenamento do território”, alega João Forte. O geógrafo reconhece que o PDM, “há anos em revisão”, prevê, de facto, uma área industrial naquele local e futuro alargamento, mas, frisa, “isso foi há 30 anos” e “as perspectivas económicas, sociais e ambientais são hoje completamente diferentes”.
Além disso, alega, há outros espaços “alternativos” para a instalação de empresas, incluindo uma zona industrial “muito próxima da A13” e com possibilidade de ampliação. Esse argumento é contrariado pela presidente da Câmara.
Célia Marques alega que a zona industrial de Saranga está situada "dentro do perímetro urbano de Alvaiázere" e "não possui qualquer espaço" disponível para "a actividade económica". Por outro lado, a área industrial do Vale da Aveleira "está praticamente lotada e sem capacidade de expansão, quer pela orografia do local (extremamente declivosa), quer [LER_MAIS] por limitações ao nível dos instrumentos de gestão territorial".
Em relação ao loteamento de Tróia, Célia Marques nota que ocupa "pouco mais de um hectares dos nove definidos pelo PDM" e que dos actuais quatro lotes "só um acolhe uma empresa em actividade" e que os restantes estão ocupados com "infra-estruturas devolutas, são exíguos e estão mal configurados", sendo "a única zona industrial que apresenta condições para ser alargada".
Além disso, acrescenta, no presente quadro comunitário "só há apoios à requalificação e alargamento de zonas industriais existentes e não para novas".
João Forte lamenta ainda que a expansão da zona industrial de Tróia, localizada na aldeia de Feiteiras de Além, possa “deitar por terra” a recuperação da antiga quinta e a conversão desse património num projecto turístico.
Luís Simões não tem, para já, muitos elementos sobre a história do local, onde existe uma pequena capela com uma inscrição de 1845 e uma imagem de São Bento, datada dos “séculos XIV ou XV”.
“Os antigos contavam que havia aqui uma ordem religiosa. O caminho de Santiago passava e passa encostado” à casa, refere o proprietário, que adquiriu a quinta há 30 anos e que, aos poucos, tem vindo a recuperar os edifícios em pedra existentes no local.
“Era tudo silvas. Trabalhei no duro durante 40 anos, sempre com a ideia de voltar à minha terra e investir aqui. Corta-se o coração pensar que querem cortar aquelas árvores”, desabafa o emigrante, que se recusa a vender a parcela pedida pela Câmara.
Num ofício enviado recentemente ao privado com uma proposta de compra, o município admitia partir para a expropriação de 2,1 hectares.
Corte de 172 árvores protegidas
De acordo com o estudo de incidências ambientais feito pelo município e que está a ser
analisado pelo Instituto de Conservação da Natureza e Florestas, o projecto de expansão
da zona industrial de Troia implicará o corte de 115 sobreiros (21 adultos e 94 jovens) e de 57 azinheiras (11 adultas e 46 jovens), duas espécies protegidas por Lei. Segundo o Município, já foram apresentadas "medidas de compensação, para "minimizar o
impacte ecológico da operação", como prevê a legislação, e que apontam para a criação de "uma nova área de povoamento no concelho, com gestão activa e vocacionada estritamente para àquelas espécies". "O património natural é um activo de Alvaiázere e constitui um motor de desenvolvimento", afirma a presidente da Câmara, frisando que "é necessário encontrar pontos de convergência e de equilíbrio entre as várias necessidades diagnosticadas" e "aumentar a oferta de lotes industriais é uma necessidade premente, do maior interesse para a sustentabilidade" .