A primeira produção indiana rodada em Portugal estreou-se em Fevereiro de 2016. Uma história de amor vivida no aeroporto Humberto Delgado, em Lisboa. O País está na mira das produções de 7.ª arte do subcontinente que, ano após ano, envia equipas de filmagem e actores em busca de cenários inusitados e românicos.
Nós últimos anos, pelo menos, Leiria, Nazaré e Óbidos serviram já de pano de fundo a quatro produções. A última, a longa-metragem Kangalim, passou pelo castelo da cidade do Lis, na última sexta-feira. A fita é um musical a transbordar de sentimento, música e dança, que terá três clips rodados em Portugal.
Dois em praias do Algarve e um no Castelo de Leiria, que é uma reinterpretação do conto infantil Rapunzel. O resto da história está no segredo dos deuses… indianos. O filme deverá estrear na Índia antes do final do ano.
“Regressámos a um sítio onde fomos bem tratados e onde tivemos grandes facilidades para trabalhar”, explica Margarida Saldanha. A produtora, ligada à empresa portuguesa Tavares The Thirteen, esteve no ano passado na região, a acompanhar as filmagens de Satyaharishchandra um outro filme indiano, do cinema de Sandalwood. com sede em Bangalore e falado em kannada – não confundir com Bollywood, a congénere indiana de Hollywood, instalada em Mumbai, que dá preferência à língua hindi.
Segundo esta responsável, a indústria do cinema indiano “descobriu” Portugal, quando o produtor indiano Rengarajan Jaiprakash, também conhecido por JP, filmou e começou a apostar no País. “Os estúdios perceberam que somos mais acessíveis e tranquilos do que outros países da Europa”, explica a produtora portuguesa.
O consenso é que Portugal poderia ser uma espécie de Cinecittà, o complexo de estúdios de Roma, com o correspondente impacto na restauração, hotelaria, turismo e florescimento de indústrias criativas ligadas ao sector do audiovisual, porém, devido às habituais dificuldade e [LER_MAIS] burocracia para obter licenças, os produtores preferem muitas vezes filmar na República Checa, Hungria ou Espanha, onde a legislação facilita o trabalho.
Se acha que o peso do cinema indiano não é importante, os números mais recentes sobre receitas de bilheteira mostram o contrário. Só em Janeiro, um filme indiano, que apenas passou nas salas na China e Índia, superou o mais recente Guerra das Estrelas, estreado em Dezembro em todo o Mundo.
Foi a fita Dangal, filme de Aamir Khan, que arrecadou 156 milhões de euros, só no Império do Meio, de acordo com o site Boxofficemojo.com. Segundo a revista Forbes, a indústria de cinema indiano irá ultrapassar 2.1 mil milhões de euros de lucro em 2018, enquanto Hollywood, beneficiando da soma da produção de televisão e cinema, alcançará nove mil milhões de euros.
O potencial turístico para um país onde os estúdios de cinema filmam também é imenso, dada a promoção alavancada pela forte expansão dos filmes produzidos na Índia (não apenas em Bollywood e Sandalwood), em todo o mundo.
Já para não falar das receitas, especialmente de restauração e hotelaria, que as cidades e vilas escolhidas pelas equipas de produção para a sua estada, conseguem arrecadar, ao longo dos dias de filmagem.
Indianos escolhem região para filmar
No dia 1 de Setembro, estreou na Índia o filme de acção e comédia Paisa Vasool, orçado em 700 mil euros, a maior produção gravada em Portugal até à data, e cuja equipa de 55 pessoas esteve 40 dias a gravar em Óbidos, Porto, Leiria, Lisboa, Sintra e Nazaré, entre outros locais.
“Óbidos tem uma rua direita, casas baixas e coloridas, é dentro de muralhas e tem muita vida. É perfeita para o nosso filme”, afirmava no início do ano passado, ao JORNAL DE LEIRIA, Catarina Gaspar, da produtora portuguesa Cinemate, parceira na realização do segundo filme indiano rodado na vila.
A película de 2017 é falada em malayala, um dos 22 idiomas oficiais da Índia. A empresa tinha até uma cena programada para o Castelo de Leiria, que acabou por não se concretizar. A passagem pela fortaleza medieval acabaria por acontecer já em Março de 2017.
Em Março do ano passado, o realizador Dayal Padmanabhan, acompanhado de uma extensa equipa, de que fazia parte Margarida Saldanha, andou dez dias pela região a filmar Satyaharishchandra, uma história com “a doçura do romance, a adrenalina da acção e o tempero da comédia”, que passou por Monte Real e pelo centro histórico e Castelo de Leiria.
Antes do incêndio que o reduziu a cinza e carvão, o Pinhal do Rei/Pinhal de Leiria também foi usado como cenário para um filme indiano, onde não faltava a música, típica deste cinema.
“Leiria e boa parte do distrito ficam a pouco mais de uma hora de Lisboa e têm locais muito diferentes das paisagens icónicas da capital, que interessam aos realizadores”, sublinha a produtora portuguesa. Ao longo do próximo ano, a produtora promete que haverá mais películas indianas a serem rodadas em locais conhecidos da região.
O filme onde Leiria resolveu o conflito israelo-palestiniano
Em Setembro de 2014, o realizador israelita Eyal Halfon rodou A Guerra de 90 minutos, em Leiria, usando o Estádio Municipal Dr. Magalhães Pessoa, acabando, pelo menos na tela, com cerca de 100 anos de conflito entre israelitas e palestinianos, com um jogo de futebol.
Segundo o argumento deste mockumentário ou docucomédia (documentário em tom satírico), os líderes de ambas as partes acordam que só há uma solução lógica para a resolução do conflito: um jogo de futebol. E esse jogo deve acontecer num país neutro, num estádio novo reconhecido pela UEFA. No pós Euro 2004, Leiria é a cidade escolhida. E assim, toda a acção passa-se durante a preparação de um jogo que nunca vemos acontecer.
Com produção da produtora O Som e a Fúria, o filme foi exibido no Teatro Miguel Franco, em Leiria, em 2017, após ter vencido o prémio para melhor actor secundário (Norman Issa) da Academia de Cinema de Israel e de melhor actor (para Norman Issa e Moshe Ivgy) no Haifa International Film Festival, e de ter estreado, a nível mundial no Festival de Cinema de Locarno (Suíça). Segundo o portal IMDB, A Guerra de 90 Minutos fez cerca de 111 milhões de euros de lucro de bilheteira.