Dentro de cerca de uma semana, o Governo poderá avançar com a fixação da taxa de IVA em 0% em 44 produtos alimentares durante seis meses.
A medida, consideram produtores ouvidos pelo JORNAL DE LEIRIA, é positiva, mas, como está e sem outras medidas estruturais, terá “pouco impacto” ou os seus benefícios “serão rapidamente absorvidos” pelos mecanismos de flutuação de preços do mercado.
Por exemplo, num cabaz mensal com um valor entre 100 e 200 euros, a poupança será apenas entre seis e 12 euros. Na lista de bens isentos de IVA, encontramos cereais e derivados, hortícolas, frutas, leguminosas, lacticínios, carne, pescado e ovos, gorduras e óleos, todos recomendados pela Direcção-Geral da Saúde e de acordo com os produtos mais consumidos pelas famílias.
O programa vai custar 640 milhões de euros e inclui 140 milhões de euros em apoios à produção.
“A ideia é boa e pode ajudar os consumidores, embora tenha pouco impacto.”
O presidente da Associação dos Produtores de Maçã de Alcobaça, Jorge Soares, fez as contas e, rapidamente chegou à conclusão que, num cabaz mensal de 100 ou 200 euros, a poupança é de apenas seis e 12 euros, respectivamente.
Ou seja, 36 ou 72 euros em seis meses, menos do que o apoio de 125 euros dado à quase totalidade dos portugueses, no final do ano passado.
O empresário entende que não se trata de uma medida estruturante, mas meramente de um “incentivo ao consumo”.
“O custo de produção, no sector frutícola, ficará exactamente igual. A electricidade, as embalagens e os adubos sofreram aumentos de 40 a 44% nos últimos anos, embora o aumento no preço final tenha sido de apenas 8%. O custo é alto para o consumidor, porém a produção diz estar estrangulada com os gastos.
“Faltam mais medidas de apoio”, resume o presidente da associação que faz uma comparação com o que se passa em Espanha onde, garante, os agricultores pagam o gasóleo agrícola e a electricidade mais baratos.
Jorge Soares diz que seria mais eficaz a adopção de medidas que “outros países já aplicaram, como a redução destes custos e dos impostos sobre a produção”.
“Seis por cento são um ganho relativo e o cabaz de compras de um português não tem apenas os produtos alvo de isenção de IVA.”
Já Uziel Carvalho, agricultor e produtor de leite no Vale do Lis, diz que há relatos de empresas produtoras de lacticínios que começaram a oferecer ainda menos pelo leite, na sequência da notícia da possibilidade de corte no IVA, forçando a uma baixa de preços.
“De uma maneira geral, sempre que um valor baixa, o produtor leva pancada. Seria de esperar que a redução fosse apenas no IVA e não no valor da matéria-prima. É uma situação estranha e isto não me parece bem encaminhado”, contesta, alertando para “empresas nacionais e multinacionais”, que usam a sua posição dominante no mercado como expediente, para baixar o que é pago ao produtor.
“Há quem, até agora, estivesse muito mal de finanças, mas a começar a recuperar e agora, perante esta nova pressão, até podem fechar portas.”
Apesar de tudo, Uziel Carvalho reconhece valor na medida que irá “apoiar, fundamentalmente, os consumidores.”
Jorge Pedrosa é padeiro em Leiria e até já perguntou ao contabilista como aplicará a taxa zero do IVA, caso a medida avance como está.
“Ele diz que não sabe, nem como será aplicada no programa de contabilidade. Seria de esperar que se pudesse colocar o valor do IVA a zero, sem mexer no resto do preço. Só que não.”
Caso todos os operadores respeitem o pacto anunciado pelo Governo, para não haver absorção da suspensão do imposto, a medida parece-lhe positiva. Contudo, experiências passadas levam Jorge Pedrosa a duvidar de tal cenário.
“Os grandes espaços comerciais não vão permitir o controlo dos valores, devido à ‘volatilidade dos preços’, podendo sempre alegar que a alteração de valor de um produto, como, por exemplo o peixe, se deve à compra do artigo numa data anterior, onde o preço estava mais alto. É um exemplo de como não aplicar a taxa zero.”
O padeiro prevê que, a haver impacto, ele não se sentirá, uma vez que já se anuncia uma nova crise de preço dos combustíveis.