Ligo o computador, acedo ao email e visualizo uma mensagem onde se lê: “Em meu nome e da Empresa X agradeço a sua visita à nossa loja na perspectiva de que todas as suas expectativas tenham sido excedidas. Para qualquer questão adicional, contacte-nos.” Assim, de forma simples, o sector comercial procura estabelecer uma relação de afeto com o cliente. Não refletindo, aprofundadamente, sobre o propósito deste email, concluímos, a sorrir, que a empresa nos “valoriza”.
Para além deste exemplo empresarial, sabemos que o afeto está presente em algumas áreas da sociedade. Ainda que o mesmo (afeto) possa ter um preço no mundo económico, são as relações humanas que o consubstanciam pela simplicidade, sinceridade, energia, entrega e cumplicidade. Dizem os manuais da psicologia e da filosofia, os livros sagrados e a própria simbiose entre o Homem e a natureza (que surgiu muito antes da escrita…), que é assim que se entrelaçam os laços da simpatia, do amor, do respeito, da liberdade, da admiração…
Na ânsia de atingir objetivos e metas, a “sociedade” e alguns “donos disto tudo”, devem-se esquecer que somos mortais. Até porque mesmo sabendo que vamos perecer, há o caminho da dignidade humana que se impõe garantir, no presente, e que se perpetuará na memória futura por quem o proporcionou, fomentou e viveu.
Além dos descendentes que o Homem deixa no mundo (até esses constroem a sua identidade e o seu caminho), tudo fica e tudo desaparece. Os edifícios caem, as estradas alteram-se, restando na estória e no pensamento (de uns quantos) o percurso da diferenciação ligado ao nome das pessoas “livres e de bons costumes”, detentoras do puro afeto e reconhecidas como tal pelos seus pares (familiares, organizacionais e sociais).
O comportamento humano é complexo. Basta olhar para cada um de nós e identificamos, decerto, na nossa história de vida, comportamentos que nos dias de hoje jamais repetiríamos. Ou será que há por aí quem tenha sido e/ou seja “perfeito”? Corrigir as fraquezas pode ser um sentido de vida. Todavia, não devemos procurar que o aperfeiçoamento individual nos leve ao ponto de perder a identidade, nem ousar converter os inconvertíveis ou, sequer, subir à estratosfera de falsos moralistas.
A sociedade, a que pertencemos e em que somos atores e figurantes, tem vários desígnios: diminuir a elevada hipocrisia da espuma dos dias; desvalorizar a imagem e compreender o valor do conteúdo; dar utilidade aos meios e com eles contribuir para temas substantivos, entre outros… Porém, mais do que seguir doutrinas ou mentes fechadas, urge derrubar barreiras, pensar, equacionar e duvidar, sem perder a essência (única e pessoal) que nos compõe.
Texto escrito segundo as regras do Novo Acordo Ortográfico de 1990