Já passaram 15 anos desde que Viviana Dionísio, operadora de comunicações do Comando Distrital de Operações de Socorro (CDOS) de Leiria, morreu numa viatura dos bombeiros, durante um incêndio da Serra dos Candeeiros, em Porto de Mós.
Em 2017, o Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria fixou a indemnização aos pais da vítima em 200 mil euros, mas o Ministério Público recorreu da decisão.
Agora, o Tribunal Central Administrativo Sul conclui que o Estado terá de pagar 200 mil euros aos pais da bombeira, acrescidos de juros de mora.
O recurso do Ministério Público (MP) considerava “que os montantes indemnizatórios fixados se revelam concretamente excessivos” e entendia que a causa da morte devia ser imputada ao construtor da viatura de comando operacional e comunicações (VCOC), onde Viviana faleceu, devido à inalação de monóxido de carbono.
“A indemnização por danos morais (…) visa compensar as dores, sofrimentos e desgostos causados por factos ilícitos a outrem, mas estes só devem ser inteiramente ressarcidos se tiverem suficiente gravidade. A mensuração objectiva de tais danos é impossível de estabelecer (…)”, justifica o MP.
O MP alegou ainda que “o recurso à equidade não obsta à ponderação, como termo de comparação, dos valores pecuniários encontrados para o mesmo efeito noutras decisões judiciais relativas a casos semelhantes, transitadas em julgado, sem prejuízo das especificidades e particularidades do caso”.
“Assim, no que respeita ao dano decorrente da morte da vítima, deveria ter sido fixado um valor não superior a 70.000 euros, tanto mais que a situação se reporta ao ano de 2006 e a jurisprudência que justificou a aplicação dos valores fixados é muito mais recente”, defende o MP.
Quanto aos danos decorrentes do desgosto que os pais da vítima sofreram com a morte desta, não deveriam ultrapassar os 20 mil euros para cada um.
O MP considera que a indemnização dever-se-ia cifrar num total de 110 mil euros.
No entanto, o acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul (TCAS), datado de 4 de Fevereiro, negou provimento ao recurso do MP e decidiu manter a decisão da primeira instância, condenando o Estado a pagar 100 mil euros de indemnização pela morte da bombeira, mais 100 mil euros pelos danos morais causados aos pais da vítima – 50 mil euros para cada um.
“Repare-se como o recorrente [MP] que em momento algum fez mea culpa, ou formulou um pedido de desculpas formal aos recorridos pelo sucedido – se atreve agora a regatear o valor até modesto da indemnização que foi condenado a prestar”, refere o despacho.
Segundo o TCAS, “se situações análogas existem, é porque o Estado Português se mantém contumaz no erro, ainda não aprendeu, pois que a repetição reiterada de factos que geram a sua responsabilização (não espontânea, mas através da sua interpelação judicial) muito dizem da sua inacção e negligência duradouras e da sua seriedade em assumir a culpa e em reparar ou compensar os danos”.
“O Estado Português testa a resistência dos demandantes, destes e de todos os demais, fazendo-os esperar, esperar, esperar, esperar. Espera o recorrente que os recorridos vão falecendo um a um, como já sucedeu nos presentes autos? Espera que as pessoas se exaurem na descrença e na desilusão? Espera que desesperem ao ponto de desistir? Bem pode esperar (…).”
O tribunal entende ainda que “a jurisprudência de outros processos não é, nem pode servir de, única referência para a fixação do montante indemnizatório objecto de condenação”, nem “tão pouco pode aceitar-se o argumento – de mau gosto, aliás – assente na pretensa “sustentabilidade financeira do Estado” para justificar a delimitação e condicionamento do justo ressarcimento dos danos que o mesmo provoca, muito menos quando em causa está um comportamento grosseiramente negligente e bastamente censurável do Estado, como é o caso”.
Após horas de trabalho, foi descansar no banco da frente de uma viatura dos bombeiros, onde acabou por morrer intoxicada. Os companheiros encontraram-na inanimada, já na fase de rescaldo do incêndio.