São muitos os casos de artistas com carreiras relevantes nas artes plásticas, cinema, jogos, cinema de animação, ilustração, cerâmica, entre outros sectores que, nas últimas três décadas se formaram na Escola Superior de Artes e Design de Caldas da Rainha (ESAD.CR).
O estabelecimento de ensino superior do Instituto Politécnico de Leiria é um reconhecido viveiro de algumas das mais inusitadas mentes criativas da actualidade. O JORNAL DE LEIRIA publica, em baixo e ao lado, uma lista de artistas com carreiras reconhecidas, forçosamente incompleta, dada a quantidade de talentos que por lá passaram, e falou com várias destas pessoas para perceber o que leva as Caldas da Rainha a serem um viveiro para tantos talentos.
A qualidade de ensino e, acima de tudo, uma grande dinâmica e proximidade entre alunos, funcionários e corpo docente, foram algumas das razões apontadas, além disso, os alunos que passaram e viveram a cidade forjaram com ela uma ligação forte.
“Caldas deixa em nós uma marca muito profunda”, admite João Pombeiro. O artista plástico recorda os anos 90, do século passado, quando foi estrear o novo edifício-sede da ESAD.CR, branco, imaculado, de estrutura leve e rasgadas janelas, para deixar entrar a luz.
“Penso que foi uma época de ouro para a escola e para a cidade. Havia uma vida muito activa, com bandas e artistas plásticos e, nós, os alunos, vivíamos numa pequena cidade onde nos cruzávamos nos cafés e lojas, numa espécie de comunidade.”
O artista plástico Tiago Baptista também aponta a facilidade e emotividade com que os alunos se relacionavam fora da escola. “Ao contrário do que acontece com os alunos de artes nas grandes cidades, era normal encontrar- nos a vivenciar e trocar ideias. Em Lisboa, por exemplo, há muitas galerias de arte, mas, nas Caldas, não as há e isso fez com que os alunos tenham sentido necessidade de desenvolver espírito crítico e de criar as suas soluções.”
Fizeram-se exposições em casa uns dos outros, apareceu o Museu Bernardo, o Caldas Late Night(CLN), que acontece este fim-de-semana, e houve quem arrendasse garagens para estrear novas exposições todas as quintas-feiras.
Nuno Gaivoto recorda aqueles primeiros anos, quando só havia 186 alunos na escola, como um cadinho de alquimista onde tudo e todos procuravam transformar o chumbo primordial do talento de cada um, no ouro que borbulhava no seu âmago.
“Naquela fábrica, que era, na verdade, um grande openspace, havia uma grande partilha entre os alunos dos diferentes anos e professores. Ao atravessá-la, passávamos pelas aulas de alunos dos vários anos. Era muito diferente das outras escolas de artes.”
Quando terminou o percurso académico, já na nova escola-sede, os estudantes eram mais de mil e Gaivoto sentia que parte daquela criatividade e extroversão se estava a perder. “Dizem- me que, hoje, já não existe o espírito de comunhão que tanto me agradou. Para mim, a ESAD.CR era um atelier à disposição de todos”, recorda.
João Pombeiro acredita que várias questões conspiraram para que a escola se tornasse num ninho de artistas e criatividade, muitas vezes expressa da maneira mais inusitada. “Fomos para uma escola nova onde havia professores que, na época, tinham uma atitude diferente do que se verificava, por exemplo, nas Belas Artes.
Ali, havia alunos com mais maturidade e outros que não tendo notas muito elevadas de acesso, eram muito inteligentes.” Para o artista plástico Tiago Baptista, também o método de ensino, no seu caso, teve o seu papel na definição do seu crescimento enquanto artista.
Aos alunos era dada grande liberdade criativa para que pudessem explorar o trabalho de “modo aberto e genuíno”. Contas feitas, muito conspirou para criar um espírito e ambiente que havia de levar os alunos a tomar em mãos o seu destino e a desenvolver esforços para construir não [LER_MAIS] apenas as fundações das suas carreiras, mas também para afirmar a escola e a cidade no mundo artístico nacional e, mais tarde, internacional.
“Não tínhamos onde expor os nossos trabalhos e, por isso, os alunos criaram o CLN, para dar a conhecer o que tinham feito ao longo do ano e do curso”, recorda João Pombeiro. Além disso, esta grande ágora artística, permitiu criar uma rede de conhecimentos, que leva, muitas vezes, os criativos a trabalhar ao lado de antigos professores e colegas, como pares.
Actualmente, a ESAD.CR continua a ser considerada como um alfobre de alguns dos mais criativos e reconhecidos artistas nacionais, fazendo carreira em sectores artísticos tão díspares como as artes plásticas, o vídeo, o teatro, a escultura ou os videojogos.
Carlos Bunga
É natural do Porto, onde nasceu em 1976, e ganhou visibilidade no contexto artístico nacional ao integrar e vencer, no final de 2003, o Prémio EDP Novos Artistas, com uma instalação site specific no piso superior de Serralves. Ao longo dos anos, o antigo aluno da ESAD.CR tornou-se um nome incontornável das artes plásticas nacionais, cruzando a arquitectura, a pintura e a performance e contando com participações em exposições, em nome próprio e colectivas, em locais como a Culturgest, a Gulbenkian – onde venceu vários prémios – ou no Museum of Contemporary Art de Detroit (EUA).
João Gabriel Pereira
Licenciado e mestre em Artes Plásticas na ESAD.CR, foi, em 2017, um dos seis finalistas do Prémio Novos Artistas Fundação EDP. Natural de Leiria, e a residir nas Caldas da Rainha, foi seleccionado entre mais de 600 candidaturas. Aos 25 anos, conta com um vasto leque de exposições, das quais se destacam Paul And Bobby, no Bregas, Lisboa (2016); Cave – Do Rio das Pe?rolas ao Rio Ave, Galeria Solar, Vila do Conde (2016); A meio de Qualquer coisa, Galeria Grac?a Branda?o, Lisboa (2016); III x III, Galeria 111, Lisboa (2016); O Lugar de Algue?m e? Fundamentalmente o Olhar, Espac?o MIRA, Porto (2015) ou Close-up 25, Pavilhão 31, Lisboa (2015). O Prémio Novos Artistas Fundação EDP 2017 é um dos maiores e mais prestigiantes prémios nacionais na área da cultura.
Nuno Sousa Vieira
O trabalho deste artista faz parte de várias colecções importantes, como a PINTA – Latin America, Centro de Artes Visuais, Colecção Teixeira de Freitas, Colecção PLMJ, Colecção António Cachola, Câmara Municipal de Leiria, Colecção Paulo Pimenta ou a Colecção José Lima. Com 46 anos, natural de Leiria, é considerado um dos nomes marcantes da arte contemporânea nacional. Docente no Instituto Politécnico de Tomar e na Escola Superior de Belas Artes, em Lisboa, tem singrado por um caminho só seu, no campo da arte e da relação com o espaço. No Dia de Portugal, 10 de Junho, que será comemorado no âmbito da Experimenta Portugal'18, em São Paulo, Brasil, o artista irá estrear, na sede do Consulado-Geral de Portugal, a exposição Instruções para pensarmos juntos.
Eduardo Morais
Estudou Som e Imagem na ESAD.CR e realizou o seu primeiro documentário – Meio Metro de Pedra – em 2010, sobre o rock’n’roll nacional, desde os anos 50 até aos nossos dias. Seguiram-se, em 2013, Música em pó e, em 2014, Uivo, homenagem ao mítico radialista António Sérgio, antes de, em 2015, ter rodado Tecla Tónica, sobre a “alquimia na música eletrónica em Portugal. Depois disso, tem trabalho em vários projectos, para a RTP, Antena 3 e produção independente.
Hugo Guerra
É a este antigo aluno que se deve o Ninja das Caldas, verdadeiro filme de culto entre a comunidade académica, e não só, na primeira década do século XXI. Um trabalho que deveria ter sido sobre o tema Paisagem, resultou num filme de ninjas, com efeitos especiais feitos em casa e venceu o OvarVideo. Hoje, Hugo Guerra habita no Reino Unido, onde é realizador e supervisor de efeitos especiais na Fire Without Smoke.
João Pombeiro
Ilustrador, produtor, realizador, guionista, designer gráfico, nasceu em Leiria e estudou Artes Plásticas na ESAD.CR. Foi um dos responsáveis para ajudar a mudar o rosto do humor nacional ao participar na criação da personagem Bruno Aleixo, em conjunto com Pedro Santo e João Moreira. Foi o realizador do videoclipe Xico, para Luísa Sobral, e foi da sua cabeça – e mãos – que saiu o genérico da nova série de Nuno Markl, 1986, que está a ser exibida na RTP e na RTP Play. Já antes tinha estado envolvido no caso de sucesso que foi Uma Nêspera no Cu, de Bruno Nogueira, Filipe Melo e Nuno Markl. Também é a ele que se devem os videoclipes da cantora de Caldas da Rainha Nadia Schilling, Cave Story e para os Nightmares on Wax.
Susana Soares
Licenciada em Design Industrial, professora universitária e investigadora em Londres, onde se dedica ao estudo das relações colaborativas entre a pesquisa científica e o design, Susana Soares tornou-se conhecida ao criar um dispositivo de vidro que poderá ser usado na detecção de cancro com ajuda da grande sensibilidade das nossas amigas abelhas. A peça faz parte do espólio do Mude – Museu do Design. A criativa já participou na Experimenta Design e foi uma das convidadas da Feira de Design de Milão 2016. Os seus projectos têm sido frequentemente expostos e publicados na Europa, Japão e EUA.
Bruno Carnide
Director e cofundador do Festival Internacional de Curtas-Metragens Leiria Film Fest é licenciado em Som e Imagem, pela ESAD.CR, tendo vencido o Concurso Nacional Artes e Breves, em 2010. Aos 30 anos, é o autor de mais de uma dezena de curtas-metragens de ficção, documentário e animação, que venceram vários prémios e foram exibidas em mais de 100 festivais de cinema em cidades como Nova Iorque, Chicago, Los Angeles, Londres, entre outras. Os seus filmes passaram pela RTP2, RTP África, SIC Radical, Porto Canal, FURG TV (Brasil) e STPtv (São Tomé e Príncipe).
Tiago Baptista
Nasceu em Leiria em 1986. Estudou Artes Plásticas na Escola Superior de Arte e Design das Caldas da Rainha. Foi vencedor do Prémio Fidelidade Mundial Jovens Pintores, em 2009, e do Prémio Aquisição Amadeo de Souza-Cardoso, em 2015. Em 2013, foi finalista do prémio Novos Artistas, da Fundação EDP. Das suas exposições destacam-se, em 2012, Prédios, árvores e uma luz bonita, na sede do colectivo a9)))), em Leiria, e Tem calma, o teu país está a desaparecer, na Galeria Zé dos Bois, em Lisboa; em 2016, levou a mostra Questionamentos ao Palácio Vila Flor, em Guimarães, e à Sala de Arte Jovem, em Madrid. Em 2015, apresentou A pequena realidade, na Galeria 3+1, em Lisboa. Vive e trabalha em Lisboa. Semanalmente, encontramos a sua banda desenhada Imagem- Viagem, na página 2 do JORNAL DE LEIRIA. O nome desta rubrica foi usado pelo artista, pela primeira vez, por ocasião do Festival Internacional de Banda Desenhada 2016, de Beja. Actualmente, trabalha em regime de residência artística na ZdB e colabora com a galeria 3+1.