Depois dos concertos da orquestra de samples em cadeira de rodas Ligados às Máquinas e de Carincur e João Pedro Fonseca com o Coro das Fontes constituído por moradores da aldeia, agendados para ontem, o festival Nascentes prossegue junto ao rio Lis, no concelho de Leiria, e amanhã, sexta-feira, depois das 19:30 horas, na eira da D. Lúcia, é apresentado o resultado da terceira residência artística de criação, que junta o baterista Ricardo Martins e o multi-instrumentista Dada Garbeck (a assegurar os teclados) com um trio de percussão formado por músicos de Leiria (António Casal, no vibrafone, Francisco Vieira, na marimba, e João Maneta, que reside nas Fontes, na bateria).
Não é a primeira, nem segunda vez, que Ricardo Martins trabalha e actua em Leiria. Ligado aos Pop Dell’Arte, Chão Maior e Fumo Ninja, entre outros, além do percurso a solo, participou em várias edições do festival A Porta, e, em 2019, no átrio do Teatro José Lúcio da Silva, apresentou-se com o ensemble de baterias (e vibrafone) Silvar, também fruto de uma residência de criação que decorreu no espaço Serra, na Reixida, onde, recentemente, gravou com Sangue Suor, outro colectivo que reúne vários bateristas. “Se pudesse, vivia aqui. Estou cá sempre que me deixam”.
Agora, no Nascentes, a experiência será, novamente, “rítmica” e tem, como ponto de partida, uma grande dose de “liberdade”. Na procura de uma “linguagem comum”, o processo deverá incluir elementos da “tradição oral” obtidos na aldeia das Fontes, onde a residência artística decorre, explica Ricardo Martins ao JORNAL DE LEIRIA. “Muito do trabalho que o Rui desenvolve com Dada Garbeck é neste sentido da recolha e reinvenção”. E conclui: “Tem a ver com esta coisa bonita do próprio festival que não vem só pedir emprestado o sítio onde existe, torna-se parte de”.
Durante cinco dias, e até ao próximo domingo, 2 de Julho, o Nascentes mistura-se com a povoação e com os habitantes e leva concertos aos lugares mais inesperados: a compositora e violoncelista Joana Guerra na eira da D. Fátima, o futurismo dos Gala Drop no jardim da Céu e do Fernando, Ayamonte Cidade Rodrigo na adega do Luís, os Kriol a reinventarem sonoridades de Cabo Verde no palco sobre o rio Lis, onde também vão mostrar-se os turcos Lalalar, o rock dos Vurro na eira das Camarinhas, as raízes do cancioneiro português com os Lavoisier na horta da D. Maria dos Anjos, e as actuações de Mais Alto!, Jhon Douglas, Cabrita, Dolu e – data única em Portugal – ZA! & la TransMegaCobla! mesmo junto à nascente do Lis.
De Espanha, ZA! & la TransMegaCobla! casa os catalães ZA! à dupla Tarta Relena e aos Megacobla, numa visão de modernidade que percorre a herança musical do Mediterrâneo.
Este ano, a co-criação entre habitantes das Fontes e artistas está na origem do Museu do Comum, um esforço colaborativo que reúne fotografias e objectos cedidos pela população. Desde utensílios domésticos a ferramentas do meio rural, além das imagens resgatadas nos álbuns de família. E todas contam uma história. O projecto recua décadas e décadas e é um detonador de recordações e afectos capaz de recuperar emoções e reanimar narrativas. Uma instalação viva, para a qual os visitantes também podem contribuir.
Já esgotada, a Jantarada d’Aldeia é outro momento de comunhão proporcionado pelo Nascentes, festival que é organizado pela Ccer Mais (cooperativa em que está alojada a Omnichord) com o apoio de inúmeros moradores e da Associação Cultural e Recreativa Nascente do Lis, responsável pelas icónicas tasquinhas em cima do rio Lis, onde não vão faltar discos e petiscos.
O paisagista, documentarista e arquivista sonoro Luís Antero vai dirigir passeios sonoros pela povoação nas manhãs de sábado e domingo, e, no sábado, é o protagonista de um concerto para olhos vendados.
No fim-de-semana, o programa do Nascente abre-se para as famílias e o contacto com a Natureza, num cenário especial. É na Estradas das Camarinhas, com a água do Lis a enfeitiçar o correr das horas, que estão concentradas as actividades para o público mais jovem, com jogos, oficinas e experiências.
No sábado, 1 de Julho, entre outras iniciativas, há um convite para descobrir as criaturas do rio, um ateliê com tintas, jornais e revistas com o propósito de enfeitar o mastro da aldeia, e outro que utilizará plantas, flores, pedras e galhos para imprimir em tons de azul e branco e explorar a técnica da cianotipia; já no domingo, crianças e adultos são desafiados a deixar marca no Mural do Nascentes, num exemplo das várias dinâmicas a decorrer durante a tarde, entre as quais, a pintura de seixos para criar personagens mais ou menos imaginárias.
Todos os momentos do festival são gratuitos.